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Top 15 rótulos eróticos (parte I)

por Filipe Silva em

É uma amostra da variedade de interpretações e abordagens ao sexo, que a indústria do vinho deu ao mundo. Como muitas outras áreas de atividade, assumindo ao longo da última década formatos cada vez mais atrevidos e descarados. Mas também criativos. Dito de outra forma, são rótulos que gritam por atenção, num mercado cada vez mais congestionado. E liberalizado também, em matéria de costumes.

Anos atrás, a ACNielsen conduziu um estudo que chegou a conclusões interessantes: rótulos com animais obtinham excelentes resultados no lançamento de novas marcas no mercado global. Um vinho de mesa com um pássaro, um cão ou até um sapo (onde é que vimos isto…?), vendia duas vezes mais depressa. Resultado, a tendência zoófila inundou prateleiras através do globo.

Mas rapidamente a indústria percebeu não há respostas absolutas. Na Rússia e leste da Europa em geral, garrafas com animais não resultavam. O consumidor eslavo reagia com receio ao design menos convencional, preferindo claramente decorações tipo “château” ou até um simples símbolo heráldico. Ainda que estampados sobre vinho ordinário, refletia melhor o prestígio do vinho francês por aquelas bandas. Assim como o apreciador europeu procura no rótulo a região e o nome de quem fez o vinho; enquanto o norte-americano é capaz de se zangar, sentir defraudado, se a etiquetagem não referir a casta. É a única coisa que lhe interessa.

Diferenças que, em matéria de sexo e erotismo, redundam na velha máxima: cada um come (neste caso, bebe) do que gosta! Foi o critério que seguimos. Muito mais do que uma apreciação estética pessoal, ou estabelecer hierarquias, procuramos sim que a amostra abrangesse distintos hábitos de consumo. Expressando diferentes contextos culturais. Como o vinho está para o terroir.

Uma série de rótulos “Pulp Fiction” terá obviamente mais impacto em imaginários povoados pela velha literatura de cordel, do que em audiências que desconhecem o fenómeno. Assim como a série “Calling Cards” é vista de outra forma por quem usou cabines telefónicas pejadas de contactos de “call girls”. Mensagens breves, compostas pela descrição do serviço oferecido e respetivo número de contacto. Esses, entenderão de imediato a ideia de estampar o telefone da adega no rótulo…

Por isso, a ordem de entradas no TOP é aleatória. O objetivo não é escalonar o gosto. Nem nos vinhos e muito menos no que toca ao erotismo da embalagem. Última nota em jeito de introdução: mau grado todas as buscas, não encontramos qualquer rótulo erótico, digno desse nome, com homens ou exibindo atributos masculinos. Os leitores que conheçam algum exemplar que nos tenha escapado, ficam desde já convidados a enviar o seu contributo.

1- Sexy

Tão simples como eficaz, o apelo da alentejana Fita Preta à sensualidade vai direto ao assunto. Sem rodeios nem preliminares. O nome diz tudo. Ou quase… A opção cromática faz o resto. Demasiado óbvio? Talvez. Mas funciona. A linguagem é complementar, adequada à garrafa e à expectativa do consumidor/a. O produto “é” o que ele/a procura ou deseja. Sem equívocos. E os resultados comprovam-no: o Sexy foi a aposta que maiores dividendos e visibilidade rendeu, inclusive internacional, à dupla composta pelo enólogo António Maçanita e o viticultor britânico David Booth, juntos desde 2004.

Maior retorno do que se julga por cá. Como sempre, em mercados mais abertos e recetivos à mensagem, como o comprova este vídeo da estação WPRI, uma afiliada da CBS.

Em termos internacionais, e “packaging” à parte, a relação do vinho com o sexo nunca mais foi a mesma desde 2004...

2- Sogno Uno

Naquele ano, Natalie Oliveros, vulgo Savanna Samson, estrela do porno americano, trocou as luz artificial dos estúdios pelo sol da Toscânia, para se dedicar ao vinho. Melhor dizendo, a relação das garrafas com o sexo mudou de plano desde que a duas vezes vencedora do “Adult Video News” para melhor atriz, imprimiu o seu corpo no “Sogno Uno”. (Des)Coberta sob um robe transparente, bem entendido.

O vinho era um tinto toscano elaborado com 70% Cesanese, 20% Sangiovese e 10% Montepulciano. Há muito desaparecido das prateleiras e não só pelos encantos de Savanna. Incluído na classificação dos melhores do ano para Robert Parker, obteve 91 pontos do famoso crítico. Parker garantiu que os pontos eram todos para o vinho e quem somos nós para desmentir. Certo é que Savanna, montada na pontuação “parkeriana”, despachou as 400 caixas iniciais e rapidamente surgiu o “Sogno Due” e o “Sogno Tre”.

O que a imprensa nem sempre refere é o trabalho de casa bem feito, por trás dos Sonhos... Sem desmerecer nos méritos de Savanna, a ex-atriz é companheira e sócia de Louis Camilleri, o egípcio de ascendência maltesa que chegou a presidente da Phillip Morris, agora grupo Altria. Conhecido como “Rei dos Cigarros”, foi ele que arrumou a casa, dividindo a gestão e propriedade da “Fattoria La Fiorita”, em Castelnuovo dell’Abate (sub-região de Montalcino), com Roberto Cipresso, estrela dos vinhos Brunello e da enologia italiana.

A propósito, entre outras consultadorias, Roberto mantém uma avença de enólogo no Vaticano. Ignoramos se levanta incompatibilidades mas o que sabemos é que, ter como clientes Savanna e o Papa, não é para todos. Assim como este “Sogno”, talvez não passe disso mesmo e nunca chegue às nossas prateleiras.


3- Siete Pecados

Assumimos, um dos nossos favoritos. O que só confirma a conversa inicial dos contextos culturais e hábitos de consumo… Neste caso, é todo o “naming” e “packaging”, pois claro, os olhos também bebem, mas igualmente pelo vinho. Um bom Rioja, que respeita o terroir. E como sempre no vinho, por tudo que o rodeia: “No hay Vida sin Pecado” é um pequeno projeto sediado na aldeia de Oyón, na Rioja Alavesa, nascido do sonho de quatro amigos (dois viticultores, um restaurador e um designer). Todos de alguma forma relacionados com o mundo do vinho.

Um sonho que a agência espanhola Sidecar projetou, em termos estéticos, para outro nível. Com a linha “Siete Pecados”, cada vinho adquire uma identidade própria, única, dentro da imagem extremamente coesa da gama. Gula, Avareza, Luxúria, Ira, Inveja, Preguiça e Orgulho, cada um dos pecados capitais aparece distinto no carácter, ainda que idênticos na forma da garrafa. Cada qual elege a sua. Tal como o vício. Depois, é impossível resistir-lhe…

Siete Pecados


4- Pornfelder

Saciado o vício, viramos a agulha para um rótulo e vinho tipicamente alemães. Mas com acento… português! Perdão, portugieser. O jovem Luke Krauss, 26 anos de idade, cuidava de uma diminuta produção de tintos tradicionais em Lambsheim, no Palatinato, vivendo sob o lema “sexo, vinho & Rock n Roll”. Longe dele imaginar-se nas páginas da “Stern”, jornais, televisões e blogs de vinho de todo o mundo, por causa de um simples nome.

Até ao dia em que um amigo escreveu a giz numa barrica, onde loteara duas castas “Geiler Pornfelder”. Elaborado a partir das tintas Blauer Portugieser e Dornfelder, o “Por” era para a primeira, com o “nfelder” a identificar a segunda variedade. O vinho tinha encontrado o seu nome.

Luke percebeu quando foi ao facebook passada meia hora e encontrou a foto da barrica, tirada com o telemóvel, inundada de comentários. Estava lançado. Depois foi só enquadrar num rótulo a condizer, o nome que o lançou para a fama.

Quanto ao prefixo, e apesar da sugestão óbvia quanto à origem portuguesa da casta, em termos ampelográficos há poucas evidências que assim seja. A tese mais conhecida é que teria sido levada do Porto por um comerciante austríaco, em 1772, para a sua quinta em Voslau. Na Húngria era até há pouco designada como kékoportó por esse motivo. Enfim, para o que interessa, no séc. XIX estava já disseminada por toda a Áustria e hoje ocupa, com a dita Dornfelder, o pódio das tintas mais cultivadas na Alemanha.


5- Quickie
Primeira entrada do chamado Novo Mundo para alguns dos mais interessantes jovens produtores australianos, intitulados “Some Young Punks”. Os punks aqui são Col McBryde, eleito enólogo revelação do ano na Austrália, Jen Gardner, confesso obsessivo compulsivo dos fermentos, e Nic Bourke. Quanto aos seus vinhos, a exemplo da nova vaga de enólogos “aussies”, distanciam-se dos corpulentos e pesados Shiraz, estilo generoso, buscando antes vinhos mais contidos e subtis. Uma geração que não renega a origem mas bastante influenciada pelo perfil Velho Mundo.  

Quanto aos rótulos, já por diversas vezes a irreverente adega de McLaren surpreendeu o mercado com aproximações à chamada Pulp Fiction, literatura de cordel americana da primeira metade do século XX. Desde os varietais Mataro e Cabernet Sauvignon de 2009, respetivamente “Lust Collides” e “Fierce Allure”; aos mais recentes “Passion Has Red Lips” (2012), “Double Love Trouble” e “Naked on Roller Skates” (ambos 2013).

O último da série, um varietal Sauvignon Blanc não foge à regra, com o sugestivo nome Quickie 2014, que poderíamos traduzir por algo como “rapidinha”… Inspirado numa novela Pulp Fiction com esse título. A produção é à medida da adega, menos de 9 mil garrafas.

O site em Flash (não tentem ver com os novos iPhones e iPads) não fica atrás dos rótulos, com um ficheiro policial bem executado, onde os produtores são os suspeitos, os vinhos a prova e a culpa… de leitores como nós, que não resistem a investigar tão original rotulagem.

Some Young Punks


6- Playboy Wines

A Playboy enganou meio mundo com as suas coelhitas louras. Vai daí, um engarrafador californiano resolveu reeditar as “playmates” mais sensuais num clube de vinhos. Nos rótulos, capas que fizeram a história da revista, nos anos 60 e 70. Edições limitadas de 550 garrafas. Como os leitores na época dourada da revista, ideal para jovens americanos imberbes, de preferência endinheirados: por cerca de 300 dólares recebiam a primeira coleção em suas casas.

Recebiam porque foi chão que deu uvas… Bom, a marca era forte, o mercado americano é vasto e não faltariam saudosistas. Assim, enquanto o clube se manteve fiel à ideia original, estampando as capas (e meninas) de maior sucesso sobre vinhos de um grupo de adegas previamente selecionadas (Janzen, Oakville Estate, St. Supery, Schug Estate, entre outras) a coisa funcionou.

Mas a Playboy não é o que era e o mundo muito menos. Tal como as margens dos bons Cabernets californianos. Os custos da operação não seriam o que a Playboy Enterprises esperava e acabou por entregar a exploração do clube a uma loja online, a Wine Barclay. Um operador de outro segmento. Rapidamente os caros Cabernets deram lugar a seleções de Tempranillos e Sauvignons, de marcas próprias e proveniência duvidosa. Vendidos como “Seis brancos sensuais” ou “Tintos espanhóis sexys e picantes”.

Claro está, assim nem os antigos leitores… Sem mencionar que o clube funcionava como a revista em termos de assinatura, no mínimo por 12 meses. Ou seja, o endereço virtual hoje abre para um domínio desconhecido, inseguro.

7- Fishwives

É seguramente a origem do Novo Mundo, cujo historial vínico mais se aproxima do Velho. Sim, a África do Sul faz vinho há séculos e a cultura Boer reflete-se em adegas e rótulos ainda mais impronunciáveis que, por exemplo, os germânicos. No caso, uma gama de vinhos da adega Buitenverwachting, da região de Constantia. À saída da cidade do Cabo, para Sul, a caminho da espetacular Baía Falsa (Valsbaal, em Afrikander), o paraíso veraneante e piscatório dos “capetonians”.

Isto para explicar a aposta de Patrick Robertson e Ed Thomas, o dinâmico duo por trás da gama “Fishwives”. Não se trata aqui de chegar aos aficionados do vinho. Por aquelas bandas, a designação peixeiras, trabalhada por Mieke Wertschnig , do studio Soil Design e o artista Sam Brown, possui a aura de rótulo de Boutique, entre os mais excitantes do momento para as senhoras do Cabo. A abordagem cativa a população feminina, que leva uma vida despreocupada entre a urbe e a mencionada Baía Falsa.

Do peculiar nome ao desenho, passando pelos textos atrevidos no contra-rótulo (e gargantilha), resulta jovial, bonito e divertido. Tudo o que elas procuram. Nada de dissertações e análises gustativas, apenas um companheiro agradável, atraente, para bons momentos. Tão pouco demasiado óbvio. Antes refinado na sensualidade. Elas preferem assim. Ou não?


8- Erotic Edition

De volta à Toscânia, o muito mais óbvio e “hard-core” trio elaborado pela V-emotions, um pequeno produtor sediado naquela região italiana. Basta dizer que toda a gama “Erotic Edition” se inspira em imagens de Dolly Buster, leia-se Nora Baumberger, uma conhecida produtora, realizadora e atriz de filmes porno.

De origem checa, Dolly conta no currículo com mais de uma centena de filmes para adultos. Em 2004 candidatou-se, sem sucesso, ao Parlamento Europeu. Embora isso pouco diga dos vinhos em causa, uma mini produção de 2500 garrafas de cada rótulo. Um tinto genérico intitulado “Madonna del Diavolo”, IGT Toscana Rosso e outro designado “Retro”, elaborado com 80% Sangiovese, 15% Merlot and 5% Syrah. Um pouco mais complexo, talvez daí o rótulo mais curvilíneo… A completar este trio erótico, o “Ecstase”, segundo o produtor, um branco com notas de limão, acácia, maçã e pêssego. Sinceramente, desconhecemos. A paleta aromática e a dita Dolly.


9- J.M. Saut

É caso para dizer que o vinho não fez história, mas qualquer busca por rótulos eróticos na internet, confrontará o leitor com um misterioso “mis en bouteille” por J.M. Saut… Invariavelmente mal identificados, quanto ao produtor e origem. Os rótulos também não fornecem outra pista, para além de situar o vinho no Sul do Ródano (Côtes du Rhône).

Pois bem, estamos em Codolet, localidade a Sul de Montelimar, entre o Gard de l`Ardeche e a região do Vaucluse. Sendo o Vaucluse perto de Orange e já bem a Norte de Chateauneuf-du-Pape, com alguma simpatia podíamos também situar o negociante que engarrafou estes vinhos nas imediações daquelas origens.

Mas percebe-se que a adega da família Saut, designada La Goulette à Codolet, tenha apostado mais na expressividade dos rótulos do que no conteúdo da garrafa. Este não seria tão longevo. Sem querer questionar a qualidade, um Côte du Rhône de um “négociant”, 20 anos depois… Para falar do vinho, na região em causa, só mesmo topo de gama e nem todos. Já os rótulos continuam a circular pela rede e, ao que parece, com sucesso. São bastante apreciados pelos colecionadores.


10- Dom Périgon Rosé 2003 Limited Edition Jeff Koons

Esta edição limitada da Dom Pérignon foi talvez a escolha que mais dúvidas nos suscitou. Disponível por encomenda, na ordem dos 20 mil euros a garrafa, será mais uma excentricidade que um rótulo, na aceção comercial da palavra. Inacessível ao público, ponto. Por outro lado, é, sem dúvida, um expoente na abordagem do vinho ao erotismo, ilustrando o extremo de luxo, exclusividade e criação artística que a indústria pode atingir. Uma grande casa de Champagne, por excelência o vinho associado à paixão e ao romance, com “packaging” de um dos mais audaciosos criadores contemporâneos. E caro, diga-se de passagem. A meteórica ascensão na última década, conferiu a Jeff Koons o título de artista vivo mais caro do planeta: há dois anos, a escultura “Cão Balão”, versão de aço dos caniches de balão que a criançada adora, “voou” por astronómicos 58 milhões de dólares.

Comecemos por aí. Cabelo curto, sorriso “ultra bright”, Koons é o artista do capitalismo triunfante. Por isso, apelidam a sua obra “dollart”. Outros, muitos mais, vêm-no como herdeiro natural do génio da Pop, Andy Warhol. Mas, enquanto este penteava notas no meio de toxicómanos, Jeff Koons é um maníaco do trabalho que não mete o nariz na coca. Administra os maços de notas verdes a partir do estúdio de Manhattan, no meio de uma bateria de assistentes, em religioso silêncio. Aí desenvolve o seu talento: esculpir brinquedos “king size” para milionários.

Claro que nem sempre foi assim. Em meados da década de 90, era um artista arruinado, destruído, quando a primeira mulher, Ilona Staller, vulgo Cicciolina, pediu o divórcio e regressou a Itália com Ludwig, o filho de ambos e razão de viver de Koons. Mas soube levantar-se. Encontrou a sua saída no brilho dos insufláveis, transposto para enormes balões de alumínio, impecavelmente polido e pintado. A genial fusão do cautchú com o aço, transpira uma perturbadora faceta sexual, no exagero e volúpia das formas. Exemplo, a representação da Vénus de Willendorf (totem da fertilidade e uma das mais antigas esculturas de forma humana, 25 000 anos A.C.) , designada “Vénus Balão”, cuja miniatura em poliuretano serve de embalagem à Dom Pérignon Rosé 2003 e ao Vintage 2004.

E tudo isto para dizer que a casa de Champagne sabia perfeitamente ao que ia, quando bateu à porta de Jeff Koons. Uma forma de projetar a marca nos meios e mercado em que o artista se movimenta, como o fez com o realizador David Lynch (Vintage 2003) ou mais recentemente a estilista holandesa Iris Van Herpen (Vintage 2004). Sendo a embalagem "Vénus Balão", por via da obra e do artista em causa, a edição limitada símbolo de volúpia e sexualidade.



Em breve, no Wineworld, os últimos 5 vinhos do TOP15

(A seguir)

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