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Crónica do narigudo

por Filipe Silva em
A prestigiada revista americana Wine Spectator publicou recentemente um artigo, descrevendo um teste no qual fora proposto a três prestigiados enólogos americanos que elaborassem um vinho da casta Pinot Noir, em três regiões completamente distintas. O objectivo do teste era concluir qual das variáveis era a mais relevante, na criação de um determinado vinho: o terroir, o enólogo ou a casta.
Cada um dos enólogos, a partir da mesma casta e com vinhas de idade equiparável, mas em regiões com condições climáticas e solos completamente diferenciados, podia assim aplicar toda a sua capacidade na busca do seu melhor Pinot. Se o terroir tivesse de facto uma importância relevante, os vinhos acabariam por mostrar essa relevância ou ainda se uma determinada nuance técnica tivesse conferido ao vinho um perfil que se destacasse dos outros, o enólogo assumiria o papel mais influenciador. É claro que se tratou de um teste absolutamente empírico sem quaisquer pretensões científicas.
A conclusão após a prova dos vinhos, a qual foi acompanhada por uma explanação completa sobre as técnicas e os componentes utilizados, foi a de que, de facto, os vinhos se assemelhavam muito uns aos outros, apesar de algumas diferenças técnicas, sendo assim a casta o factor mais determinante. Ora, esta constatação, que infelizmente fere alguns egos da indústria (… ainda parece que existem eminências pardas…), faz de facto todo o sentido. O teste, na realidade, escondeu aquela que é a competência técnica que mais diferencia os enólogos entre si e que é a capacidade de prova colocada ao serviço da arte de fazer lotes.
Actualmente já é vulgar ouvir-se que “o difícil é fazer mau vinho”. Com a variedade de soluções tecnológicas, que os enólogos têm em seu poder e com a universalidade e o grau de conhecimento atingidos nesta área, fazer mau vinho até já podia ser considerado “crime público”.
Os fenómenos de vedetismo de alguns enólogos, que eram muito alimentados sobretudo na imprensa internacional dos anos 90, nomeadamente com o surgimento dos “flying winemakers” (tivemos o privilégio de conhecer alguns como Michel Roland e Philip Shaw) contribuíram para que se criassem alguns mitos (urbanos?...), alguns deles que ainda hoje persistem.
O facto é que nos últimos anos, a crítica também evoluiu e já dificilmente se ilude. O enólogo é importante, mas está longe de ser o factor determinante. A uva – o fruto - condiciona tudo. E se é verdade que muitas correcções se podem fazer sobre as uvas da má vindima, também não é menos verdade que de uvas medianas não saem grandes vinhos.
A casta e a vinha fazem de facto toda a diferença. E os enólogos que, por sorte ou por sabedoria, se conseguem acercar das melhores castas e vinhas, conseguem de facto destacar- se dos outros. Basta muitas vezes não inventar e seguir as técnicas mais simples, pois os grandes vinhos já trazem o seu” passaporte carimbado” ao caírem no tegão.
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