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Sugar wine

por Filipe Silva em
Aquele que é hoje em dia um dos mais populares e poderosos ingredientes da indústria alimentar (esse truque de magia chamado “açúcar”) já há muito invadiu a indústria do vinho. Do novo ao velho mundo. Do Sul ao Norte, um pouco por todo o lado.

Um guia de vinhos português publicado recentemente continha, a par de uma básica classificação e caracterização organoléptica, um conjunto de análises laboratoriais dos vinhos em análise, em que um dos indicadores era o grau de açúcar, o que no vinho se mede em gramas / litro (g/l).

Normalmente, nos vinhos de mesa (com excepção dos espumantes e vinhos fortificados ou vinhos de colheita tardia), isto é nos que se consideram como "vinho seco", pode-se encontrar cerca de 2 g/l de chamado açúcar residual. O açúcar residual é aquele que resta da uva após a fermentação tradicional do mosto. Algo que faz parte do vinho e da uva, de forma natural.

Nesse guia, no entanto, muitos dos vinhos analisados mostram claramente percentagens elevadas açúcar, muitos com 4 gramas de açúcar por exemplo ou até mais (alguns com 7 gramas). Esta concentração de açúcar (que não é açúcar residual …), é obviamente originada, em 99,99% dos casos, através de métodos de fabrico que se destinam a tornar o vinho um produto “fabricado”, para além dos condicionalismos naturais.

Assim são hoje em dia produzidos vinhos chamados de “comerciais”, os quais (não raras as vezes), além de ganharem várias medalhas em diferentes concursos, vendem-se como pãezinhos quentes, proporcionando aos enólogos soluções verdadeiramente “mágicas”, capazes de domar os mais adstringentes taninos ou de esconder os mais oblíquos defeitos que, de outra forma, marcariam negativamente o lote, afastando-o dos circuitos mais comerciais.

Esta moda, que muito se popularizou nos produtores mais orientados para os mercados nórdicos e anglo-saxónicos, desenvolveu-se sobretudo devido ao facto de, nesses mercados, o vinho ser sobretudo consumido como aperitivo, sem acompanhamento gastronómico, diferentemente do que acontece nos países do velho mundo (como Portugal), em que o vinho é sobretudo bebido acompanhando a comida. E em Portugal também já é uma moda que veio para ficar....

A popularização do “fast-food” também veio tornar cada vez mais presente o açúcar nos hábitos alimentares e consequentemente muito mais sugestiva a sua presença num produto tradicional como o vinho, o qual tem que lutar contra um conjunto de concorrentes que dominam o consumo através do “sugar lobby” e tem que ser consumido acompanhando alimentos carregados de sacarose.

A verdade é que muitos consumidores não se apercebem de como o vinho se torna mais “fácil” e “guloso”, consoante tem ou não tem adição de açúcar, ao mesmo tempo que a indústria e grande parte dos enólogos, provadores e jornalistas nem sequer querem abordar frontalmente esta “verdade inconveniente”.

Há várias formas de tornar um vinho mais doce. A questão crítica, para o enólogo, é a de garantir que o açúcar que é colocado no vinho não se torna posteriormente num alimento para bactérias, dentro da garrafa, o que poderá provocar refermentações, com a consequente deterioração do produto. Várias técnicas existem para que esse tipo de contaminação bacteriológica seja evitada, entre as quais, por exemplo, a pasteurização ou a adição de conservantes, como é o caso Dimetil Dicarbonato (DMDC). Este último, sendo permitido pela legislação europeia, pode inclusivamente apresentar riscos nocivos para a saúde, como é o caso da possibilidade da presença de metanol (uma substancia potencialmente cancerígena),no caso de existir algum erro nesta adição. Mas isso são contas para outro rosário, digamos, para outra crónica.

Entretanto não se esqueça: todo o cuidado é pouco. No caso de um vinho lhe parecer “demasiado” guloso, não deixe de se interrogar …
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