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Vinho não é investimento
Em declarações à agência Reuters, Robert Parker considera que somando os custos de armazenamento, a lenta valorização e os riscos associados ao vinho, um bem perecível e de fácil deterioração, faz com que o investimento nesta área nem sempre dê frutos. “Tem de ser devidamente acondicionado e guardado, se possível seguro contra riscos vários, o que é um somatório considerável de custos. Há 37 anos que penso que o vinho é um péssimo investimento.”
Como é sabido, Robert Parker e a sua escala de 100 pontos tiveram um impacto sem precedents no mundo do vinho, fazendo e “desfazendo” rótulos, mas este ano anunciou a sua retirada das provas En Primeur, passando a Neal Martin a responsabilidade de avaliar os vinhos ainda em barrica. Precisamente a escolha ou aposta que para o comprador mais se aproxima do conceito de investimento em sentido lato, pois trata-se de uma aplicação de capital num bem que só nos é entregue 2 anos depois. Contudo, Parker continuará a provar e classificar os bordaleses já em garrafa, de colheitas anteriores, a começar já pela famosa colheita de 2005, que ele próprio admitiu ter pontuado demasiado baixo da primeira vez.
Para além das amostras de 2014, a cargo de Neal Martin, não é segredo que Parker tem criticado os vinhos bordaleses, acusando-os de “overpricing”, em particular nas 3 colheitas anteriores (2011, 1012 e 2013), e com isso perderem a confiança de comerciantes e compradores em todo o mundo. Entrevistado o mês passado por uma revista britância, o crítico norte-americano acusou mesmo Bordéus de matar o sistema de vendas En Primeur, com a alta constante dos preços, independentemente da qualidade das colheitas.
Ou seja, a compra antecipada dos vinhos já não representa nenhuma vantagem, nem sequer em colheitas menos consideradas. Na mesma entrevista, Parker considerou que os preços da hierarquia bordalesa teriam de ajustar cerca de 30%, para reconquistar a confiança do comércio. “Penso que o mercado En Primeur atualmente está moribundo, ou mesmo morto, excetuando uma eventual grande, grande colheita”, conclui o crítico norte-americano depois de afirmar que Bordéus tardou a entender que estamos num mercado global: “terão de o reconhecer mais cedo ou mais tarde…”
Nota de rodapé, Parker mais não faz do que expressar a realidade que qualquer apreciador constata, de há uns anos a esta parte. Há 10 anos, mesmo o apreciador mediano podia encontrar na internet atraentes ofertas e encomendar meia dúzia de rótulos famosos a preços muito em conta, vendo essa aposta recompensada quando os vinhos saíam e rapidamente atingiam valores exorbitantes. Assim foi, por exemplo, com os 2000 e 2001, como assim tinha sido com as históricas colheitas de 82 e 83… permitindo ao apreciador mais atento deliciar-se, anos depois, com joias tidas por inacessíveis.
Mas, durante a primeira década do século e à medida que se acentuava a procura a oriente, assistiu-se a uma escalada dos preços ao ponto de cobrarem pelo vinho em barrica praticamente o mesmo que iria custar dois anos depois, ao chegar ao mercado. Quando não até mais do que na altura da entrega. Tem sido essa a tendência dos últimos anos, com a agravante da inflação verificada nas grandes colheitas nunca ser corrigida nos anos seguintes, ou seja, em anos menores. Veja-se por exemplo, os aumentos registados com os 2005 e 2010 – grandes colheitas, sim senhor – sem a correspondente descida nos anos seguintes…